sábado, 20 de agosto de 2011

O futuro da esquerda: quadros promissores

Neste post eu reúno quadros políticos de esquerda que podem ser considerados jovens, e que ainda têm muitas eleições pela frente. São principalmente do PT, por este ser o maior partido da esquerda competitiva no Brasil, com 3 mandatos consecutivos na presidência. Neste levantamento, o político mais novo tem 28 anos e o mais velho tem 51. A maioria está na casa dos 40 anos, o que permite mais 2 ou 3 décadas de vida pública, a princípio. Além do critério principal, da idade, procurei selecionar lideranças de todas as regiões do país e que fossem, no mínimo, deputado(a) federal. Se alguém lembrar mais algum quadro, por favor, citar nos comentários. Penso que estes nomes têm potencial para crescerem politicamente em seus respectivos estados. Mas, para permanecer na própria presidência, a esquerda deve apresentar nomes viáveis que, provavelmente, sairão deste leque de opções:

PT

Gleisi Hoffman45 (PR)
Senadora e Ministra Chefe
da Casa Civil
Possível candidata a
governadora do Paraná (2014)
 Fernando Haddad48 (SP)
Ministro da Educação
Possível candidato a
prefeito de São Paulo (2012)
Lindberg Farias41 (RJ)
Senador
Possível candidato a
governador do Rio (2014)

Luizianne Lins42 (CE)
Prefeita de Fortaleza
Possível candidata a
governadora do Ceará (2014)
Marcelo Déda51 (SE)
Governador de Sergipe
Maria do Rosário44 (RS)
Ministra dos Direitos Humanos
Ex-candidata a prefeita
de Porto Alegre (2008)

Nelson Pelegrino50 (BA)
Deputado Federal
Possível candidato a
prefeito de Salvador (2012)
Alessandro Molon39 (RJ)
Deputado Federal
Ex-candidato a prefeito
do Rio (2008)
Ângela Portela49 (RR)
Senadora

Cláudio Puty41 (PA)
Deputado Federal
Presidente da Comissão de Finanças da Câmara

Rogério Carvalho 43 (RJ)
Deputado Federal
Possível candidato a
prefeito de Aracajú (2012)
Gabriel Guimarães28 (MG)
Deputado Federal

Outros Partidos

Eduardo Campos46 
(PSB/PE)
Governador de Pernambuco
 Manuela d’Ávilla30 
(PCdoB / RS)
Deputada Federal
Possível candidata a prefeita de Porto Alegre (2012)
Brizola Neto32 
(PDT / RJ)
Deputado Federal

É preciso considerar que, nas próximas décadas, surgirão novas lideranças que podem ascender rapidamente nas estruturas de poder internas dos partidos. De qualquer forma, as lideranças neste post já estão consideravelmente consolidadas, têm um trabalho reconhecido, além de preparo e compromisso social.

Ademais, é impressionante como o nível da aparência melhorou.

terça-feira, 5 de julho de 2011

O jornalismo que só pode ser de esgoto

A mídia pode exercer a função de fiscalizar, cobrar, pressionar o Governo. Pelo menos é o que defende boa parte dos jornalistas. “Mídia não pode ser chapa branca”, explicam. De fato, o jornalismo pode ajudar a descobrir coisas erradas e incentivar os governos a mostrar trabalho. Seria válido, se valesse pra todos os partidos, e todas as correntes ideológicas. Os veículos de maior alcance, no Brasil, deram grande visibilidade para as críticas da oposição e os escândalos do Governo Lula, é seguro dizer. Mesmo à figura pessoal do Lula, há sempre certa resistência, por parte do colunismo político. Ao ponto de simpatizantes da esquerda e do lulismo disseminarem-se pela internet com blogs para rebater as versões mais comuns no jornalismo. Seriam tantos esquerdistas complexados? Acometidos de mania de perseguição? Adeptos de uma teoria da conspiração? Alguns, pode ser. Todos, improvável.

Pelo menos este caso, do Paraná, estampa de forma gritante que o jornalismo pode ter preferências e simpatias, usando dois pesos e duas medidas. À época dos mandatos de Requião, Fábio Campanha era implacável! As críticas, as mais duras, eram diárias. Poderíamos aplaudir a postura vigilante, fiscalizadora, republicana, do jornalista. Não fosse a mais abrupta inversão de posicionamento, assim que iniciou o governo do PSDB no Paraná, com Beto Richa. O jornalista passou a uma eufórica tietagem do tucano. Ainda sobram críticas a Requião. Eventualmente, ao Governo Federal. Campana virou crítico ferrenho... da oposição! Exercida naquele estado principalmente pelo PT. Ao governador, o jornalista presta um serviço melhor que o de qualquer assessoria de imprensa. Essa história de jornalista crítico e combativo parece depender da conveniência... Uma pessoa pode ter preferências político-ideológica. Mas, uma coisa é expressá-las como um cidadão comum, outra coisa é travestir militância partidária de "jornalismo".

Campana é colunista político de alguns dos maiores jornais do Paraná: O Estado do Paraná, Tribuna do Paraná e Gazeta do Paraná. É ainda diretor da editora Travessa dos Editores, e editor das revistas Et Cetera e Ideias.

  

 

 

quarta-feira, 8 de junho de 2011

O caso Palocci

Do papel da mídia

Pressão da oposição, por si, não derruba ninguém. Pressão da oposição, o Governo sofre permanentemente, em vários pontos do mandato. Sem a decisiva contribuição da mídia, um episódio como o do Palocci jamais tomaria estas proporções. Mas, convenhamos, um Ministro chave que teve seu patrimônio multiplicado por 20 em alguns anos é algo que para ser amplamente explorado não precisa de mídia golpista, precisa de mídia. Qualquer veículo de comunicação verá neste tipo de episodio um prato cheio – pela relevância do acusado, pela possibilidade de uso do tom alarmista ao qual a mídia predispõe-se, pela intensa movimentação gerada, pela atenção que chama etc. De maneira geral, o jornalismo tem se utilizado destes expedientes, como estratégia de sobrevivência mesmo. A entrevista que Palocci concedeu a Jornal Nacional, por exemplo, garantiu excelentes índices de audiência.

Agora, é evidente que houve exageros e precipitações ao longo de toda a cobertura feita do caso – seja pelo alarmismo de praxe, seja pelas simpatias políticas de quem comenta. Após o ex-Ministro ter falado ao JN, Cristiana Lôbo comentou, no Jornal das 10, que sem a entrevista,”nós estaríamos aqui discutindo os nomes que substituiriam Palocci na Casa Civil”. Pois foi exatamente o que a colega dela, Renata Lo Prete, tinha feito dois blocos antes.E o que a própria Cristiana tinha feito no Fatos Versões do sábado anterior. O que dá bem o tom da precipitação que contaminou a cobertura sobre do tema, desde o começo. E é claro que a cobertura ostensiva, em todos os principais espaços midiáticos, já garante o prolongamento e agravamento do caso, ainda que não haja concretamente um fato novo. Não se trata, portanto, de movimentos ou avaliações exclusivas do mundo político.

Do mérito

Um caso como este manifesta avaliações diametralmente divergentes: desde aquelas que enxergam um delito gravíssimo, que exala tráfico de influência e faz da presença de Palocci no Governo algo que prejudica o país; até aquela que descarta qualquer possibilidade de crime, e reduz tudo ao embate político. Respectivamente, os discursos da oposição e do governo. Diante de um espectro tão amplo de leituras, e considerando a contaminação política que de fato existe, o melhor parece mesmo recorrer à análise do mérito. E, neste caso, o mérito é jurídico. Até o momento, o Procurador Geral da República optou pelo arquivamento do caso, alegando que não há indícios mínimos de atividade criminosa tipificada pela lei.

Considerando os valores estratosféricos que as empresas estão dispostas a pagar – e falamos aqui de algumas das maiores empresas do país – não é de se estranhar a evolução patrimonial de Palocci. É bastante comum que o setor privado invista valores vultosos para atividades de consultoria, palestras etc. O questionamento que pode ser elaborado é no sentido da promiscuidade deste trânsito entre a atividade empresarial e a política, quando certos atores migram de uma para a outra ou conciliam diferentes interesses. A questão é válida, mas seria um trabalho árduo repensar esta relação, na medida em que a maioria dos deputados exerce atividades privadas ou comerciais.

Do desfecho

A presença de Palocci no Governo tornou-se politicamente desvantajosa. O parecer do procurador proporcionou um discurso para a base aliada, e até poderia manter o Ministro na Casa Civil. Porém, isto representaria um custo muito grande. A oposição teria mais respaldo para aprovar a convocação de Palocci ao Congresso e até para conquistar mais assinaturas para uma CPI. A mídia teria justificativa para manter o assunto aquecido. O Governo teria imensa dificuldade para construir o que se denomina “agenda positiva”. Seria muito inviável.

Da imagem de Dilma

Retomando a idéia de que um episódio como este não torna a mídia brasileira golpista, avalio que o tratamento jornalístico concedido à Dilma continua até bastante simpático – profundamente diferente daquele concedido ao Lula. Fora algumas exceções mais afobadas (tipo Merval Pereira), tem sido comum a interpretação de que Dilma tratou o caso com discrição e sobriedade. Claro que algum desgaste é inevitável. Perder o principal Ministro com 5 meses de Governo é um duro golpe. Mas nada que não possa ser dissipado ao longo do tempo, ou que prejudique de forma grave a avaliação da presidenta.

Da alternativa




Glesi é um quadro político em ascensão, inteligente, bem articulada, e defensora competente do Governo. Foi secretária no governo do Mato Grosso do Sul e na prefeitura de Londrina, além de diretora de finanças de Itaipu. É advogada, com especialização em Gestão e Administração Financeira. Politicamente, participou da equipe de transição de Lula, em 2002, e foi presidente do PT no Paraná. Eleitoralmente, concorreu ao Senado em 2006, quando perdeu para Álvaro Dias (apesar do favoritismo do adversário, Gleisi obteve votação expressiva); concorreu ainda à prefeitura de Curitiba em 2008; e foi eleita a senadora mais votada do Paraná, no ano passado, mesmo disputando contra o Governador Roberto Requião (que ficou com a segunda vaga), e com os candidatos da chapa de Beto Richa, do PSDB, que foi eleito Governador. Tem opiniões um pouco mais conservadoras que a média do PT para temas como aborto e direitos de homossexuais. O pouco envolvimento da senadora com o mundo político de Brasília pode ser um mérito. Espera-se de Gleisi Hoffman um trabalho mais técnico, de gestão e menos político, como é a proposta da própria Dilma na presidência. A escolha fortalece muito um quadro petista de grande potencial.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Conivência ou Resistência: uma questão de atitude.

Ditadura gay. Heterofobia. Gays como classe ‘especial’ ou privilegiada.
Violação da liberdade de condenar. Censura ao ‘direito de ser contra’.

Às vezes, a simples forma como uma opinião começa a ser enunciada é suficiente pra revelar toda uma mentalidade. Que aspecto alguém opta por salientar, numa discussão complexa e múltipla, pode ser sintomático de toda uma postura. Eu acho, no mínimo, muito intrigante, por exemplo, este discurso que opta por denunciar uma possível inversão de quadro que levaria a uma ‘ditadura gay’, ou à ‘heterofobia’. Nas conversas informais, no twitter, em comunidades online, em caixas de comentários de blogs etc. vejo como as pessoas incomodam-se com o fato de gays, agora, serem um grupo ‘intocado’, protegido, com o qual ‘ninguém mexe’. Daqui a pouco vai ser motivo de vergonha homem se relacionar com mulher, teme-se. Em breve, vão impor a homossexualidade, a nós e a nossas crianças, especula-se.

Hoje, é praticamente garantida a presença de argumentos deste nível em debates sobre homossexualidade. É mesmo um ponto de vista intrigante. Especialmente, num país em que os homossexuais, para além de serem ‘mexidos’, discriminados de inúmeras formas, são MORTOS por ser quem são. Um país em que as formas de agressões, físicas e morais, são absolutamente disseminadas, cotidianas e bárbaras. Um país em que o jogador de vôlei foi hostilizado por um estádio inteiro por ser gay, o rapaz da paulista teve uma lâmpada estourada no rosto porque desconfiaram de sua masculinidade, a adolescente de Goiás foi assassinada por namorar a filha de um fazendeiro. Neste contexto, alguém estar mais preocupado com o movimento de proteção dos gays me diz o bastante.

Editorial da Folha de São Paulo de hoje defende que, numa sociedade civilizada e democrática as pessoas devem ter o direito de “se manifestar pacificamente contra homossexuais”. Será que as pessoas também deveriam ter o direito de se manifestar pacificamente contra negros? Contra mulheres? Contra nordestinos? Contra pobres? É muito fácil dizer que as pessoas podem manifestar seus preconceitos, quando todo mundo sabe quem serão os alvos destes preconceitos. E, certamente, não serão brancos, centro-sulistas, grandes empresários e banqueiros, ou heterossexuais. Recorrer ao grande guarda-chuva da liberdade de expressão, como forma de manter ataques morais, é muito cômodo para quem não será atingido por eles. Historicamente, e ainda hoje de forma explícita, os discursos “pacificamente contrários” voltam-se covardemente para aqueles grupos que sempre foram penalizados e excluídos.

Homossexuais precisam de uma legislação específica para proteger seus direitos, porque ninguém resolve de repente manifestar-se pacificamente contra héteros. A situação dos homossexuais em nosso país (sim, porque em várias nações já há muitos avanços) é estarrecedora. Carece de mais avanços, até mesmo, do que a situação dos negros ou das mulheres – que também são alijados em muitos aspectos. Não falo apenas da CNBB, das igrejas evangélicas, dos pastores e lideranças religiosas, que se organizam, pressionam o poder público, manifestam-se abertamente contra os gays, e trabalham para sabotar a igualdade civil e violar as liberdades humanas. Eu falo mesmo de uma consciência bastante popularizada, ainda, de que a homossexualidade é algo anormal, desviante, doentio. E isto acaba por sedimentar atos de repúdio, agressão, marginalização e restrição da cidadania de inúmeros brasileiros.

Tentar dar um basta a isto não significa conceder tratamento privilegiado, significa conceder tratamento diferenciado a quem é tratado de maneira diferenciada pela sociedade. E pouco importa que a maioria da população “seja contra” gays (pacificamente ou não). Não é possível ser conivente com a discriminação, não é possível subjugar uma minoria em nome da conveniência da maioria – e isto, sim, é verdadeiramente democrático. Nenhuma mentalidade, conservadora e dogmática, por mais disseminada ou majoritária que seja, pode diferenciar cidadãos com base em algo como preferência sexual e afetiva. Não em um Estado laico, democrático de direito. A profissão da fé, os valores individuais, os ódios cultivados, as contrariedades morais, as pessoas devem guardar para si, quando estão em jogo direitos fundamentais.

quinta-feira, 5 de maio de 2011

eBook Mídias Sociais e Eleições 2010

Amigos, finalmente foi lançado o e-Book Mídias Sociais e Eleições 2010, organizado por mim, pela Nina Santos e pela PaperCliQ. Estão reunidos neste material mais de 20 artigos, de autores convidados e selecionados, sobre a relação entre as tecnologias digitais e o mundo político. Foi um trabalho grande, mas recompensador. Podem baixar gratuitamente neste link do 4shared. Boa leitura! Espero que gostem!



quinta-feira, 21 de abril de 2011

Capa e-book Mídias Sociais e Eleições 2010

Em breve será lançado o e-book "Mídias Sociais e Eleições 2010", organizado por mim, pela Nina Santos e pelo Tarcízio Silva, da PaperCliQ. Este livro reúne artigos que tratam de usos das tecnologias digitais no processo eleitoral brasileiro de 2010. Alguns autores, como Murillo de Aragão, Carlos Manhanelli, Martha Gabriel, Gil Castilho, dentre outros, foram convidados para compor o e-book. Outros autores foram selecionados por Chamada de Trabalho. Assim que o material for lançado, estará disponível aqui no blog o link para download. Fiquem atentos!


segunda-feira, 18 de abril de 2011

As distinções que não podemos ignorar


"Mais uma vez a oposição e, sobretudo, o PSDB não entenderam o argumento de Fernando Henrique. O ex-presidente escreveu um excelente artigo na revista Interesse Nacional, que deve sair amanhã. A Folha de São Paulo publicou. Eu e algumas pessoas que recebemos a revista fomos brindados com a íntegra do artigo por antecipação. Fernando Henrique continua um estupendo analista. Não perdeu a mão como analista político, como sociólogo."


"O ex-presidente é amigo pessoal e uma espécie de guru do sociólogo Manuel Castells, da Universidade Southern California, nos Estados Unidos, um dos maiores estudiosos da nova sociedade civil que vem se organizando através das novas mídias ... "
Merval Pereira – O Globo


"Crivado de flechas impiedosamentecomo o São Sebastião da música de Chico Buarque –, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso anda atônito e desolado. [...] O mais espantoso: o fogo cerrado começou imediatamente depois do presidente honorário do PSDB produzir – em tempo de muita intriga e pensamento ralo e rasteiro – um dos mais brilhantes, completos e elevados textos políticos em forma e conteúdo sobre os descaminhos e equívocos das oposições no Brasil."
Vitor Hugo Soares – Blog do Noblat


"O artigo divulgado esta semana foi escrito pelo sociólogo Fernando Henriquenão pelo político semi-aposentado que ele é. [...] Como presidente da República, Fernando Henrique provou na pele a dor pelo que não disse. E também a dor pelo que disse e acabou interpretado de outra forma. Ele não disse "esqueçam o que escrevi". Mas a frase foi posta em sua boca e ali permanece até hoje. Ele chamou de "vagabundos" servidores que abusavam de artifícios para se aposentar antes do tempo. Ficou que ele chamara os aposentados de "vagabundos."

Ricardo Noblat – Blog do Noblat

É, não precisa ser um PhD em análise de discurso pra perceber a verdadeira euforia com que FHC é defendido por certos segmentos da mídia brasileira. Incompreendido, sacrificado, brilhante, são alguns dos termos com que o ex-presidente tucano foi tratado. A idolatria que jornalistas dedicam a Fernando Henrique chega ao absoluto ridículo, provoca constrangimento alheio ao leitor. Indisfarçável como o objeto maior da veneração jornalística é a formação sociológica do tucano. Nada surpreendente numa mentalidade em que bom político é o que tem formação canônica, erudita, aquela que pode distinguir a análise política da análise ‘científica’. E somos obrigados a ler isto mesmo após o governo do metalúrgico, que acabou aclamado por 85% dos brasileiros. Mas este, é claro, continua sem “méritos”, aos olhos dos esclarecidos – posto que nem fundamental completo tem, quanto mais doutoramento em sociologia para compreender as entranhas do povo, ora.

Só acho pouco digno não admitir que existe lado nos espaços de maior alcance da mídia brasileira. Não são todos os colunistas, não são todos os veículos, nem todas as análises feitas estão engajadas num complô. Mas, as figuras proeminentes do colunismo nos veículos de maior audiência, claramente, apresentam simpatias, preferências, aproximações com um determinado campo político. É importante persistir neste ponto, porque há: 1) uma tentativa de desqualificar esta percepção, alegando mania de perseguição dos “petistas”, incompreensão da heterogeneidade daquilo que seria a mídia, ou afins; e ainda 2) uma tentativa de dizer o inverso: que a mídia é enviesada num sentido que favoreceria o PT. Esta última tese, por bizarra que é, defendida apenas por lunáticos da estirpe de Diogo Mainardi e Reinaldo Azevedo. Aliás, em texto recente, Azevedo identifica um “petismo jornalístico, sobretudo na TV”.




Ainda sobre o artigo em que Fernando Henrique sugere que o PSDB não deve ter muito sucesso se tentar conquistar as classes mais baixas (ou seja, o povão), Lula deu uma resposta simplesmente precisa e eloqüente: a de que o “povão” deve ser a própria razão de ser do Brasil. A diferença é abissal: uma postura, mais estratégica, avalia o que seria eleitoralmente mais proveitoso, foca a crescente e já majoritária classe média brasileira e se permite o luxo de não priorizar as classes mais baixas – as quais, neste raciocínio, estariam "aparelhadas" ou "cooptadas"; a outra postura adota os estratos mais pobres, não apenas como prioridade, mas como propósito central, a própria razão da existência política. Outra coisa: o que seria aparelhamento da sociedade ou "cooptação eleitoral" é, na verdade, instrumento de promoção da cidadania, obrigação política, econômica e humanitária do poder público. É isto que sintetiza a resposta brilhante de Lula, que, apesar dos muitos títulos honoris causa que o cara tá ganhando, carrega um tipo de brilhantismo que não precisa de doutorado.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Da liturgia do cargo: os 100 dias de lua de mel do Governo

Completados 100 dias de Governo, começam a proliferar pela mídia – impressa e televisiva – opiniões, editoriais, análises ou debates sobre o desempenho de Dilma à frente do executivo. Evidente, há avaliações negativas e críticas sobre determinados tópicos, como a inflação. Mas, de modo geral, o mandato da primeira mulher presidente tem sido elogiado - quase sempre por seu estilo vsto como 'discreto' e 'mais técnico'. Pode-se mesmo dizer que os especialistas midiáticos estão numa espécie de lua de mel com o Governo, especialmente se compararmos à cobertura jornalística que se deu ao longo dos mandatos de Lula. Uma inflexão e tanto! O último IBOPE sobre avaliação presidencial também trouxe um quadro muito positivo para Dilma Rousseff. Pela pesquisa, 56% consideram o Governo ótimo ou bom. Este patamar de aprovação é superior aos que FHC e Lula conseguiram, nestes momentos dos respectivos mandatos de cada um. Se a avaliação do Governo foi boa, a da pessoa da presidenta foi ainda melhor: ela é aprovada por 73% dos entrevistados.

Pelo menos as opiniões encontradas nos principais veículos de comunicação dão-se mais acerca de uma imagem pública da presidenta, um estilo identificado, atributos e valores mais subjetivos. Questões práticas e administrativas não têm sido a tônica das avaliações. Do ponto de vista da imagem pública, alguns fatores ajudam a entender os números tão favoráveis ao Planalto. O próprio cargo de presidente da república e a liturgia em torno dele já conferem ao seu ocupante alguma altivez, prestigio, e até certo carisma. Obviamente, isto em uma conjuntura favorável e com uma agenda pública que beneficie a imagem do presidente. Este primeiro ano do mandato de Dilma continua marcado pelo bom momento do país – consumo aquecido, desemprego muito baixo, indústria reagindo etc. A sensação de bem-estar predominante contribui para que o chefe do principal cargo da república seja visto de forma positiva pela população. Além disso, estes primeiros meses do mandato foram marcados por episódios interessantes para a imagem da presidenta.

A visita de Obama, por exemplo, sintetiza de maneira muito clara o prestígio do Brasil neste momento. As cerimônias de recepção, a aparições públicas ao lado do americano, e os mecanismos jornalísticos que tornam especiais eventos como este, agregaram valor à figura da governante. Outros momentos mais midiáticos de Dilma foram as aparições nos programas de Ana Maria Braga e Hebe Camargo. Participações em programas com este perfil aproximam Dilma de um público mais popular, com grande percentagem de mulheres, e que espera conhecer aspectos mais humanos dos políticos. Trabalhar publicamente aspectos mais humanos é importante para que a maior parte da população seja aproximada do governante. Lula sempre foi visto pelos brasileiros de forma muito humanizada, em função da própria trajetória de vida que criava uma conexão e uma empatia direta com a maior parte dos brasileiros, e também por uma personalidade mais aberta, informal e extrovertida. Dilma ainda precisa construir esta ponte. Por isso, iniciativas midiáticas que explorem seu lado mais ‘comum’, descontraído ou leve, são pertinentes.

Mesmo o estereotipo de “durona” sofreu alguns abalos com a emoção que Dilma demonstrou no discurso de posse no congresso e agora com a tragédia em realengo. O falecimento do ex-presidente, José Alencar, também trouxe uma carga de pessoalidade à presidenta. Este elo com a população, mais multifacetado, em várias dimensões – políticas, ideológicas, e também mais humanizadas – é fundamental para a construção de uma imagem positiva sólida e disseminada. Por isso, as lamentações de uma parte da esquerda pela visita de Dilma às apresentadoras, além da presença no aniversário de 90 anos da Folha, não faz muito sentido. A presidenta governa para todos os brasileiros e deve estar aberta ao diálogo com os mais variados segmentos da sociedade. As estratégias de comunicação do Planalto devem pretender-se amplas e conciliadoras. O Governo Federal e a presidenta devem continuar aparecendo bem cotados nas próximas pesquisas, mantidos o cenário sócio-econômico favorável, uma agenda pública bem pensada, e uma cobertura midiática que não seja muito hostil – o que vem ocorrendo, ao contrário do que houve com Lula. De toda forma, o prognostico inicial para a presidenta não poderia ser muito melhor do que isto.


segunda-feira, 4 de abril de 2011

A democracia que queremos (uma resposta ao Noblat e ao Bolsonaro).

Nesta segunda, Noblat escreveu um artigo para defender a liberdade do deputado Bolsonaro de defender suas opiniões, e criticar os que se colocaram contra o parlamentar, os 'fascistas do bem'. Segundo o colunista, se não respeitamos as declarações de Bolsonaro, nos igualamos a eles, nos tornamos intolerantes também. Noblat incomoda-se com uma ‘patrulha estridente do politicamente correto’, que seria ‘opressiva, autoritária, antidemocrática’. Claro, o blogueiro também não perde a oportunidade de espinafrar Lula, por causa de uma piada que o ex-presidente fez com a cidade de Pelotas, décadas atrás. Noblat parte do seguinte pressuposto: “Nossa capacidade de tolerar os intolerantes é que dá a medida do nosso comprometimento para valer com a liberdade e a democracia”. É uma premissa absolutamente falsa!

Não é verdade que, em nome da liberdade de expressão ou da tolerância, qualquer discurso está justificado ou seja inimputável. Não é possível que rigorosamente todas as falas sejam aceitas, como partes legítimas do debate democrático, sob pena de nos igualarmos a um Bolsonaro da vida. É claro que as diversas opiniões podem ser defendidas, inclusive aquelas que são contrárias a direitos de minorias como as cotas raciais, casamento civil gay, adoção por casais homossexuais etc. Aliás, elas já o são, ao contrário do que insinua cinicamente o Noblat. O problema está no ataque proferido, na injúria, na discriminação, na perseguição praticada contra grupos historicamente excluídos sob vários aspectos. Não, nem toda opinião é parte legitima do debate, e isso não viola, mas fortalece a democracia.

Paulo Moreira Leite, da Época, é muito feliz quando cita o exemplo da França, em que a extrema direita defende seus posicionamentos, mas sem atacar outros grupos. Jean-Marie Le Pen defende a ‘França para os franceses’, mas toma cuidado para não agredir os imigrantes. É igualmente obscuro, mas qualitativamente diferente. Aqui, o ‘politicamente correto’ cumpre uma função primordial, na medida em que protege direitos. Este quadro é sintomático de uma democracia amadurecida, em que não há espaço para discursos intolerantes – os de verdade, não os fabricados por sofismas como os do Noblat. Paulo M. Leite argumenta que “a sociedade francesa não permite. A força das idéias democráticas naquele país é tal que não se aceita que as teses antidemocráticas sejam proferidas em público, de modo exibicionista e ofensivo, como faz Bolsonaro”.

Noblat deturpa argumentos, inverte valores e tenta igualar coisas muito diferentes, no afã de atacar Lula e a esquerda (sim, porque foi principalmente pessoas identificadas com a esquerda que se insurgiram contra Bolsonaro, seja na blogosfera, seja no Congresso, vide Jean Wyllys / PSOL, Manuela D’Ávila / PC do B e Brizola Neto / PDT). O guarda-chuva da tolerância não pode abrigar todos! Não pode abrigar, por exemplo, um neonazista, e também não tem espaço para os Bolsanaros. Ninguém pode reivindicar para si o direito de perseguir, constranger, condenar, agredir de qualquer forma, outro grupo, por ser diferente. É premissa jurídica básica que um direito termina onde começa outro. O exercício pleno da cidadania deve ser estendido a todos, sem distinções. Alguns defendem isto, outros não. É preciso escolher um lado, há muito que se avançar a este respeito no Brasil, e é neste sentido que devemos seguir, sem hesitações.

domingo, 16 de janeiro de 2011

O significado da tragédia no Rio

No caso das tragédias na Região Serrana do Rio, parece que o problema não são certas áreas ocupadas por uma parcela da população que, sem alternativa, ocupa áreas de risco. O problema não é setorizado, é generalizado. A solução, portanto, não passa apenas por programas para reduzir o déficit habitacional, construção de conjuntos populares etc. Em Teresópolis e Nova Friburgo, por exemplo, seria preciso discutir as próprias existências das cidades ali. Nas palavras da presidente Dilma, moradia irregular no Brasil tem se tornado regra e não exceção. Re-ordenamento e planejamento urbano ganham aqui novos significados, muito mais complexos. Há bastante tempo, não é mais suficiente remover alguns moradores (via de regra, bastante humildes) de uma ou outra rua, é preciso modificar a forma como a nossa sociedade ocupa o território onde vivemos.

Esta catástrofe no Rio de Janeiro, que já se consolida como a maior da história do nosso país, tem causas diversas: segundo as matérias que estão sendo feitas, há um cruzamento infeliz de volume excepcional de chuvas, disposição geográfica agravante e, obviamente, ocupação irregular do solo. Porém, apesar das conhecidas intempéries naturais, é muito importante manter o foco na responsabilidade dos agentes públicos competentes (adjetivo que exala ironia em momentos como este). Encaminhar a compreensão deste episódio a partir de questões como o excesso de chuva, o aquecimento global, a rapidez e violência dos fenômenos naturais, ainda que procedentes, podem desvirtuar o debate principal que consiste na reconfiguração das formas como nos expandimos pelo território, algo que envolve toda a sociedade, é claro, mas que deve ser executado pelo poder público.

Vários especialistas apontam que um dos problemas centrais está na falta de articulação entre as diferentes esferas de Governo. Não há coerência entre as secretarias municipais, estaduais e os ministérios, o que gera ações dispersas e pouco eficientes. Uma concepção mais ampla para o problema é urgente. Ademais, muitas vezes há ciência dos problemas e até conhecimento técnico para agir, mas falta vontade política. O próprio CREA / RJ, dentre outras instituições, já vem fazendo estudos alertando sobre áreas de riscos, há décadas. E isto chega às mãos de vários agentes públicos. Porém, as secretarias responsáveis não têm ascendência sobre a administração, contam com pouco orçamento e acabam sem sucesso. É difícil um governante bancar alterações realmente profundas, cujos resultados só serão conhecidos no longo prazo e que não são político-eleitoralmente interessantes.

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Por fim, é preciso entender que tragédias naturais como estas ensejam outra discussão. Há muito tempo, o centro de todas as nossas explicações foi a religião, a fé. A Igreja era a instituição mais influente, e Deus a figura mais proeminente. O Paradigma Moderno alterou isto, e colocou o homem no centro de tudo. O sujeito moderno é senhor de si mesmo, medida de todas as coisas. Tudo mais deveria estar em função do homem, e de sua racionalidade. Os recursos naturais eram estoques, a serviço do desejo e da ambição dos homens, preocupados apenas com a exploração, a acumulação, o crescimento. Atualmente, este paradigma está em crise. A natureza não pode ser mero objeto da razão humana, não pode estar subjugada, nem é previsível para nós. Todos os nossos estudos sobre as chuvas só servem para gerar manchetes do tipo: “choveu em dois dias o que estava previsto para um mês inteiro” ou coisa que o valha. Precisamos abrir mão de nosso protagonismo narcisista e admitir que não somos o centro do planeta, devemos respeitar a natureza e aprender a conviver com ela.