sábado, 28 de fevereiro de 2009

O contorcionismo retórico da mídia

Fico impressionado com as voltas que a mídia dá, quando quer converter em realidade dada aquilo que é a sua impressão. Peguemos esse recente exemplo da entrevista de Jarbas à Veja e a súbita demonização do PMDB, um partido que é a quintessência do fisiologismo deste país, sempre esteve subserviente ao poder (qualquer poder), verdadeiro parasita da máquina pública nos grotões, onde possui o maior número de prefeituras. O PMDB detém a maior bancada em praticamente qualquer parlamento brasileiro: congresso, assembléias legislativas, câmaras municipais, onde quer que seja, é o PMDB quem pode garantir a maioria, e aproveita-se disso para barganhar governabilidade. Isso é desde a década passada, e em todas as esferas de poder. Só agora a mídia descobriu a postura anti-republicana PMDBista?! Só agora Jarbas, Gabeira e Cia formarão um “grupo suprapartidário de combate à corrupção”?! Ah, tenham dó! Note-se que “por coincidência” há um movimento de aproximação do PMDB com a candidatura da Dilma à presidência. Fala-se até mesmo em nomes, no caso, o do Ministro Geddel Vieira Lima, da Bahia.

Ano passado tivemos os episódios do dossiê da Casa Civil e a cobertura das eleições municipais, campeões da esquizofrenia midiática. Estamos apenas no segundo mês de 2009 e já temos a medalha de ouro: o caso do Castelo! Edmar Moreira, dono do Castelo, é do DEM, apoiou todos os candidatos que o DEM apoiou nas últimas eleições (Serra em 2002, Alckmin em 2006, Aécio em 2002 e 2006), é um dos principais articuladores do Aécio no congresso, faz sistemática oposição ao Governo Lula, é super influente no partido, o filho dele é deputado estadual pelo DEM, a irmã dele é prefeita em MG pelo PSDB. E, diante de tudo isso, a mídia transformou o episódio do Castelo em um escândalo do PT! Lucia Hippólito argumenta que Edmar Moreira é defendido pelo PT e teve votos no partido para segundo vice-presidente, porque evitou a punição de mensaleiros no passado. A mesma avaliação é feita pelo Jornal da Globo, que chamou para responder pelo escândalo o presidente do DEM, Rodrigo Maia, e o líder do PT na câmara, Candido Vaccarezza.

É o óbvio que o presidente do partido de Edmar deve satisfações, mas Edmar foi eleito segundo vice-presidente pelo plenário, teve votos no PT como teve em vários partidos, a partir de acordos previamente feitos. O Estadão noticiou que “Para dirigentes (do DEM), situação se tornou insustentável politicamente dentro da legenda após descoberta de castelo”. Claro... porque é super fácil esconder um Castelo, por todos estes anos, de toda a direção do partido. Morro de pena do Rodrigo Maia, quando ele aparece consternado, estupefato com o caso do Castelo. Reinaldo Azevedo foi além, disse que “o DEM parece disposto a fazer a depuração. Se depender do PT, no entanto, Edmar continuará protegido na torre de seu castelo.” Aí só o Reinaldo mesmo... é o cúmulo da desfaçatez fazer de baluarte da moralidade o partido de Antônio Carlos Magalhães – um homem que montou uma verdadeira máfia na Bahia; de César Maia – possivelmente o ex-prefeito mais rejeitado de que se tem notícia; de Jorge Bornhausen – que representa o que há de mais conservador e elitista no Brasil; um partido que é um dos resquícios da Ditadura neste país.

O mais triste é que esta visão é uma grande referência para a mídia. Isso que o Reinaldo fala é mais ou menos o que está norteando os editoriais e as “reportagens” de boa parte da grande imprensa. Reinaldo Azevedo, junto com Diogo Mainardi, são os grandes mentores da mídia, são vozes de peso na modus operandi midiático. Tantas vezes a Veja é reverenciada por veículos como Folha, Globo e Estadão, quando estes repercutem matérias ou entrevistas feitas pela Revista da Abril. Mainardi e Azevedo são respeitados e admirados por boa parte dos jornalistas e, sabidamente, ambos posicionam-se declaradamente contra o PT (como ilustram os livros “O país dos Petralhas” de Reinaldo, e “Lula é minha anta” do Diogo) e, quando necessário, a favor do PSDB / DEM (como ilustra este podcast de 1 do 10 de 2006, em que eles manifestam torcida por Geraldo Alckmin). O tratamento que a mídia deu ao caso do Castelo vai exatamente ao encontro da visão de Reinaldo. Tentar vincular o PT à corrupção e a notícias negativas a qualquer custo é outro exercício diário dos dois articulistas da Veja, seguido como um mantra pela mídia brasileira.

Como todos bons mentores, também são algozes quando precisam. Neste vídeo, Mainardi diz que os jornalistas tinham simpatia pessoal pelo Lula, torciam por ele, e trabalhavam para o Governo no começo do mandato petista. Azevedo sustenta a tese de que existe “um núcleo comum de esquerda” na Imprensa. Para exemplificar, diz que o Papa é mais atacado pelos jornalistas que o traficante Marcola, e que muitas matérias tendem a defender a descriminalização do aborto – que seriam bandeiras típicas da esquerda. Pode até ser, mas quando a presidência do Brasil é disputada por um candidato do PSDB e outro do PT, a mídia fecha descaradamente com o primeiro! Duvido o Reinaldo usar o período das eleições para ilustrar a sua tese. Não digo que os jornalistas, de maneira geral, simpatizam mais com PSDB / DEM “por causa” dos articulistas da Veja, mas são duas vozes de peso, que funcionam como marcadores, ou seja, estabelecem parâmetros para construir uma perspectiva em torno de determinado fato político, como o caso do Castelo. Mesmo os jornalistas que não escreveram uma única linha sobre o episódio, acabam tomando por naturais idéias absurdas como esta beatificação do DEM e a constante má vontade com o PT. E isso fará a diferença nas próximas oportunidades. A partidarização da mídia é consolidada e difundida.

2 comentários:

  1. Eu vou mais longe no título do texto, e digo que quando a mídia acha conveniente, ela vai além do contorcionismo, e faz uso de outro artifício: mágica.

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  2. Ah, sim! Boa observação. Tem uns que tiram cada coelho da cartola...

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