segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Dilma é "mais gerentão do que humano".

Sempre que a Dilma aparece na grande Imprensa, é de forma prejudicial a sua imagem. Entre os analistas políticos, é comum a premissa de que Dilma é uma mulher intratável, intragável, insuportável, que terá de ser enfiada goela abaixo da população em 2010. Em parte, isto está relacionado ao perfil mais exigente, firme e incisivo da Ministra – o que é natural e admirável, partindo de um homem; mas é visto como grosseria e antipatia quando parte de uma mulher. Estou bastante convencido da existência de um componente de gênero neste processo. Ontem, Christian Pior, do Pânico, fez uma enquete entre seus entrevistados para escolher a “Mulher do Ano”, candidatas: Geisy Arruda (a mais votada), Michelle Obama (que levou alguns votos) e Dilma (que não teve nenhum voto). Claro que ninguém leva a sério uma enquete do Pânico. Mas eu fiquei imaginando... Mesmo que levassem a sério, o desempenho da petista não seria tão diferente. A maioria da população não conhece a Dilma, mas os que conhecem tendem a nutrir alguma rejeição por ela.

Muitas pessoas vinculam Dilma ao Sarney, ou ao apagão, ou sentem falta de carisma na pré-candidata, ou não gostam dela mesmo sem saber exatamente o porquê. Evidente que isto está vinculado à cobertura jornalística. O Gilberto Dimenstein resumiu a Dilma a uma “sisuda burocrata, que nunca teve nenhum voto”. Vocês já viram o FHC ser tratado nestes termos? Claro que, em algum momento, algum jornalista pode ter se referido ao ex-presidente em termos parecidos, mas a falta de carisma do Fernando Henrique nunca foi pretexto para ele ser retratado quase que invariavelmente como um “sisudo intelectual”. E olha que – se aceitarmos que “carisma” é um critério válido para avaliar um ser humano (quando não é) – nem FHC, nem Serra está em situação mais favorável que Dilma. Entretanto, para a presidenciável do PT, a suposta “falta de carisma”, a falta de “jogo de cintura”, a sisudez e a dureza tornaram-se pecados mortais. A verdade é que nem Dilma, nem Serra, nem ninguém tem apenas um lado da personalidade para mostrar. Ninguém é duro e rígido em todas as situações, assim como ninguém é afável e só sorrisos em tempo integral.



Mas, para o Josias de Souza, se a Dilma tem a audácia de falar em um tom de voz que não se aproxime do grito, só pode ser obra dos marketeiros mágicos do PT. Já perdi a conta de quantas matérias assim eu já li na Veja, Isto É etc. Josias insinua (e não é o único) que uma nova Dilma está sendo fabricada – da maneira mais artificial possível – para ser apresentada à população nas eleições. Para o blogueiro da Folha, a verdadeira Dilma é aquela que rispidamente chamou uma jornalista de “minha filha”, na entrevista coletiva que deu sobre as causas do apagão. Concordo que tratamentos como “minha filha”, “minha querida” têm de ser banidos do discurso de um presidenciável. Mas todos os telejornais estavam jogando pro país uma frase de Dilma, fora do contexto, em que ela falava que não teria mais apagão. A cobertura sobre a pane elétrica teve forte viés político-eleitoral (diferente, por exemplo, da cobertura sobre o acidente no Rodoanel), analistas políticos reverenciados trataram o assunto na base do “apagão do FHC versus apagão do Lula”.

A pergunta da jornalista “minha filha” foi exatamente sobre esta comparação entre a gestão atual e a anterior. Apesar de incorreta, não sei se a reação da Ministra era pra menos. Foi uma reação de quem tem brios. A Ministra tinha, de fato, muito o que falar, esclarecer e colocar os pingos nos is. Dilma diz, por exemplo, que as árvores de natal que têm este ano no Parque do Ibirapuera, na Lagoa Rodrigo de Freitas, às margens do Guaíba no Rio Grande do Sul, dentre várias outras localidades, não poderiam existir na época do racionamento do Fernando Henrique, por falta de energia! Nenhuma empresa deixa mais de vir ao Brasil – gerar investimentos e empregos – por falta de energia, porque hoje a situação é totalmente diferente. E agora os jornalistas vêm cobrar da Ministra que ela prometeu energia e não cumpriu. Acho inadequado, porém compreensível que Dilma tenha se exaltado. Antes de ser candidata, Dilma é humana. E por mais que você, leitor, esteja achando esta constatação óbvia, não é tanto.

O jornalista de O Globo, Gustavo Paul, declarou no programa Fatos e Versões, aos 5’, que Marina Silva tem uma história muito parecida com a do Lula, que pode fazer chorar, e vai rivalizar com Dilma, que já teria uma história mais dura, mais “de gerentão” do que de humano. Vejam vocês a que ponto chegam as análises! Dilma sofreria de uma falta de carisma tão aguda, que se afastaria de um perfil mais “humano”, seja lá o que o jornalista quis dizer com isso. Já ouvi pessoas nas ruas, amigos e familiares fazerem comentários na mesma linha... É como se a Dilma antipática fosse a realidade inquestionável, e a Dilma ponderada fosse uma construção artificial dos marketeiros. As pessoas não percebem que tanto uma quanto a outra são formas diferentes de retratar uma mesma pessoa. Óbvio, os marketeiros do PT vão retratar a candidata de uma maneira positiva, ganham pra isso. Os jornalistas, por motivos menos óbvios, sempre retratam Dilma de maneira negativa. O Horário Eleitoral gratuito é importante para todos os candidatos, mas é simplesmente vital para alguns. Se Dilma quiser apresentar-se à sociedade de maneira mais positiva, só assim.

2 comentários:

  1. Isso me lembra comentários que ouvi na campanha presidencial do Lula, dizendo que ele era grosseiro (acho que pela barba e voz rouca, sei lá), pouco instruído e baderneiro (isso provavelmente pelas várias vezes que a mídia informou o seu nível de escolaridade e mostrou imagens como líder de sindicato, entre discursos, multidões, greves, etc). Anos e anos desconstruindo essa imagem, até conseguir se eleger. Qualquer lição aprendida a partir disto será utilizada pela DilmaResta para "compensar" sua falta de história que "pode fazer chorar"... (além, claro, de contar com a eficiência dos publicitários da campanha, rs)

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  2. correção: Errei no "DilmaResta". Não foi nenhuma brincadeira com o sobrenome da ministra ou sobra de comentário anterior. Aliás, até agora não sei o que foi!

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