sábado, 31 de janeiro de 2009

Fabricação de crises: um estudo de caso.

Normalmente, eu evito falar sobre assuntos regionais. A proposta deste blog é discutir temas nacionais, geralmente relativos ao Governo Federal, com repercussão em veículos de comunicação dirigidos a todo o país. Entretanto, vou abrir uma exceção, por achar que este episódio também pode ilustrar realidades nacionais. Aqui no Pará, nos últimos tempos, viveu-se uma espécie de crise na área de Segurança Pública. Como toda crise, esta se fez perceber pela grande visibilidade que ganhou na mídia. As chamadas “crises”, na verdade, dizem respeito a problemas crônicos ou que são sentidos pela população diariamente. Mas, a partir de algum fato específico e simbólico, os meios de comunicação, estrategicamente, passam a produzir um volume maior de reportagens sobre o tema, gerando desgaste político a governantes e colocando o assunto na pauta do dia da audiência. A mídia nacional faz isso com freqüência. Já vivemos diversas “crises”, notadamente a partir de 2003.

Talvez, os fatos que motivaram a tal crise de Segurança Pública no Pará tenham sido os assassinatos de um jovem promotor da prefeitura, muito bem relacionado, e de um médico cardiologista, também muito reconhecido em Belém. A classe média alta belenense foi às ruas, manifestou-se e, dessa vez, os veículos de comunicação locais deram grande eco às reivindicações por mais Segurança. Diversas reportagens, apresentadores indignados, especialistas convidados para esclarecer a situação proliferaram nas emissoras. Via de regra, os especialistas elucidavam o problema com responsabilização dos governantes, ausência de políticas adequadas, inoperância e negligência das autoridades. Agora, se vamos à realidade concreta, vemos que fatos importantes foram ignorados. O Governo atual, do PT, fez concurso público para contratação de 1.500 novos policiais para o estado, os quais já estão nas ruas, treinados e equipados. Mais um concurso já foi autorizado, e a previsão é que se contrate mais 2.200 novos policiais.

Além disso, o Governo petista eleito em 2006 já entregou 70 novas viaturas às policias Civil e Militar, 27 novas motocicletas, Sistema GPS para impedir que as viaturas desvirtuem seus objetivos, 50 câmeras de monitoramento das ruas, dentre outras iniciativas. Durante os 3 mandatos do PSDB, entretanto, houve diminuição do contingente policial, de 13 para 12 mil homens, e a máquina estadual de Segurança sofreu sucateamento. Ainda no período tucano, pouquíssimo investimento foi feito na área Social. Seria impossível que o Estado do Pará, especialmente, a Região Metropolitana de Belém, não sofresse uma onda de criminalidade. Por muitos anos, os Governantes seguiram à risca a receita para convulsões sociais e crescimento da violência. Entretanto, durante este período, a mídia calou-se, não fez nenhuma denúncia, não fomentou um debate, nem tornou público o problema. Novamente, vemos uma correspondência com os meios de comunicação nacionais, que sabem ser combativos só contra determinados governos.

Diante da pressão, o Governo do Estado cedeu, e reconduziu ao comando da Polícia Civil o delegado Raimundo Benassuly, aquele que havia sido retirado do cargo por questionar as faculdades mentais da menina que foi mantida em uma cela com vários homens, em Abaetetuba (PA). O recuo da Governadora petista provocou forte reação de jornalísticos, locais e nacionais. De fato, é estranho que não exista outro nome, mais apropriado, para assumir o comando da corporação. De todo modo, penso que a principal lição que podemos tirar deste episódio paraense diz respeito aos interesses de classes. Inúmeras são as vítimas da violência nos bairros periféricos de Belém, diariamente. Nunca vemos mobilizações ou reações a esta realidade. Entretanto, assim que esta violência passa a atingir pessoas mais bem posicionadas, a resposta é imediata e contundente. É como se a criminalidade fosse natural ou pertencesse aos pobres, e só consistiria em um problema quando extrapolasse uma linha. A indignação egocêntrica de segmentos da sociedade organizada e da mídia é cruelmente hipócrita.

4 comentários:

  1. Eu morei em Fortaleza por mais de sete anos, conheci muitos de seus conterrâneos, gente da melhor qualidade. Mas você tem razão, estou aqui em BH já a quase um ano e meio e, neste curto período, tenho mais notícias do Pará do que tive no tempo que passei no Ceará, estranho não? É o fenômeno PT no governo e que é, ao meu ver, muito positivo, pois obriga quem assumiu o governo fazer mais do que os seus antecessores.

    ResponderExcluir
  2. A criminalidade não pertence aos pobres, mas a pobreza estimula a violência...A situação se agrava quando as soluções buscada pelos governantes se restringem a medidas paliativas, como o aumento do contingente policial. Para cortar o mal pela raíz, é necessário investir em educação e cidadania.

    ResponderExcluir
  3. Eu concordo que a violência deve ser debatida diariamente na mídia regional. Afinal, os índices dela não param de crescer. E concordo também que a mídia não pode dar atenção apenas quando pessoas influentes estejam em fichas policiais. Porém, não podemos esquecer que a violência faz parte do cotidiano de um enorme número de pessoas que vivem em bairros periféricos. É uma realidade que nem conseguimos imaginar, dona de uma maldade tamanha. Se a mídia não consegue, ou não quer, cobrir diariamente a violência desses bairros mais carentes, podemos aproveitar esses lapsos de "bondade" para demonstrarmos o tamanho real da violência em nossa cidade. E, talvez, fazer com que a cobertura jornalística fique mais justa, isso sem se importar se o governo é de esquerda ou não...

    ResponderExcluir
  4. a "crise" é a grande aposta da oposição. Uma espécie de "Mensalão 2, a missão". Pressinto, porém, que vão dar com os burros n´água!

    ResponderExcluir