sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

O malabarismo dos jornalistas

Os jornalistas dos veículos de comunicação mais tradicionais têm a mania de ensaiar o mesmo discurso para determinadas pautas. Isso não significa que eles marcam encontros na calada da noite para combinar o que vão falar sobre determinado assunto. Mas, na hora de fazer a notícia ou de construir opiniões, os jornalistas levam em conta não apenas as “fontes”, mas as próprias opiniões e impressões dos outros colegas jornalistas, dos editores-chefes, dos patrões, enfim, da categoria. Nesse processo, quase que automaticamente, as mesmas interpretações vão se proliferando dentre os especialistas da mídia. Isso, além da má vontade contra determinados grupos políticos, estando ou não no poder. Mas nem sempre se trata de uma partidarização, às vezes é puro corporativismo. Uma das pautas que gera discurso uníssono nos meios de comunicação é a avaliação sensacional do Governo Lula, agora no patamar dos 70%.

Nunca antes na história desse país um presidente foi tão bem avaliado. 73% de ótimo e bom, e o desempenho pessoal de Lula é aprovado por 84%, segundo o Ibope. O recorde anterior foi atingido por Sarney no ano de 1986. Quanto maior fica a aprovação da população ao Governo Lula, menos verossímil fica a versão da mídia para esses números. Os jornalistas atribuem os recordes históricos do Governo Lula a um mero reflexo da bonança econômica no mundo (ou seja, o velho discurso tucano do “céu de brigadeiro”), ou a uma capacidade comunicativa do Presidente, que de fato existe, mas não passa de uma abstração e não explica a satisfação da população. Para citar alguns mais recentes, verifiquei esta interpretação nos comentários da Cristiana Lôbo no Jornal das 10 da Globo News, em seu blog, nos comentários de Sardenberg, também no Jornal das 10, e de Nêumane Pinto, no Jornal do SBT. Mas já vi a mesma linha de raciocínio ser desenvolvida por outros especialistas, em outros lugares.

Há uma clara resistência em reconhecer os méritos do Governo, em admitir que ações federais muito concretas estão, cada vez mais, beneficiando milhões de brasileiros. Daí a utilização de abstrações e escapismos na hora de analisar a voz que vem das ruas, nas pesquisas de opinião. Por um lado, os jornalistas estão corretos ao falarem da bonança econômica, pois de fato a produtividade mundial cresceu no período lulista, mas essa é apenas parte da explicação. O Governo reduziu impostos para setores estratégicos; diminuiu sistematicamente (ainda que pudesse ter diminuído mais) a taxa básica de juros; adotou uma política sólida de câmbio flutuante, valorizando o Real; investiu fortemente na área social, o que fomenta o crescimento econômico; dentre outras medidas. Logo, o bom momento brasileiro não é mera sorte, nem fortuito. Quando especialistas falam que a população é levada por frases do Presidente como “Pergunta para o Bush (sobre a crise)”, subestimam, não o Governo, mas a própria capacidade da população de avaliar um mandato.

É possível que a aprovação recorde deva-se, dentre outros fatores, justamente à forma como o Governo vem reagindo à crise. No último domingo, no programa Manhattan Connection, da GNT (da Globosat), o economista Ricardo Amorim afirmou que, se fosse feita uma escala da crise, a Finlândia, maior vítima, seria atingida em um nível 10; os EUA, também fortemente afetados, estariam no 8; o Canadá ficaria em torno de 6; e o Brasil, 1. Isso mesmo, 1! Ricardo falou ainda que, em 2009, o saldo de empregos brasileiro será positivo, com mais geração do que perdas. Brincaram com o economista, dizendo que ele precisava abrir os olhos. Ele respondeu que é contrário: basta abrir os olhos, ver o que está acontecendo aqui, para perceber tudo isso. Diogo Mainardi, colunista da Veja que também compõe a mesa do Manhattan, quase teve um infarto ao lado do economista, por motivos que vocês podem imaginar. É direito e dever da mídia criticar o Governo, mas distorcer análises apenas para omitir méritos é muito sujo.

5 comentários:

  1. "É direito e dever da mídia criticar o Governo, mas distorcer análises apenas para omitir méritos é muito sujo"... Eu diria mais: é padrão e faz parte de um grande jogo de interesses.

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  2. ótimo texto! Talvez, em vez de malabarismo, o título poderia ser a "coreografia dos jornalistas". Mas não deixa de ser espetáculo mesmo...

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  3. Caro Crápula,

    muito bom o seu texto. Continue com esta lucidez e facilidade de lidar com as palavras e também de sintetizar as idéias. Repassarei este texto a todos os meus contatos e recomendarei seu blog. Ganhastes um admirador.

    Um abraço

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  4. Repórter de Sandálias,
    concordo com você. Certamente há um padrão, construído sobre uma série de interesses muito claros.

    Interferente,
    obrigado! De fato, o termo "coreografia" seria muito pertinente! hehehe

    Márcio,
    muito obrigado pelos elogios, fico feliz que você tenha gostado do Blog. Visitarei o seu também. Volte sempre!

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  5. Na minha modesta opinião o que uma parte da imprensa faz não jamais ser chamado de jornalismo, é um insulto ao profissional sério.
    Parabéns, tá escrevendo cada vez melhor.

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