Esse
foi provavelmente o caso de direito de resposta mais revoltante da campanha de
2012. A história começou quando o Haddad mostrou em seu programa de TV, sobre
saúde, o caso de José Machado, um idoso, morador da periferia de São Paulo, que
espera há dois anos por uma cirurgia de catarata. Até aí, nada de mais. É bem
comum os programas eleitorais usarem depoimentos de cidadãos na TV. A questão
foi que José Serra reagiu a esse caso, dizendo que tudo era uma invenção do
PT, e que o cidadão sequer tinha catarata. A doença de José Machado seria,
segundo Serra, o pterígio - crescimento de tecido sobre a córnea. Para fazer
todas essas declarações, é claro, Serra precisou ter acesso ao prontuário do
paciente, o que deveria ser sigiloso, mas esse sigilo foi quebrado pela
prefeitura, para repassar dados ao candidato que representa a gestão – o
primeiro absurdo.
Toda
a versão de Serra sobre o caso pode ser observada nessa entrevista que ele
concedeu à TV Estadão. O candidato do PSDB sustenta que quem quebrou sigilo foi
o PT, ao levar o caso à televisão, e é veemente ao afirmar que o paciente não tem
catarata. Serra é tão categórico ao falar sobre o assunto que tenta constranger
os jornalistas perguntando: “Vocês concordam que não era catarata? Sim ou não?
[...] Não era catarata. Eles já admitiram que não era catarata [...] Eles mentiram,
eles fizeram uma farsa”.
Bem,
o Estadão não deixou por isso mesmo e foi atrás do exame a que José Machado
tinha se submetido. O jornal constatou que o paciente tinha, SIM, catarata. Os exames tinham sido feitos há poucas semanas, e o laudo foi assinado em 4 de
setembro pelo médico Pedro José Cardoso, do Instituto Cema. José Machado autorizou,
por escrito, a divulgação dos dados pela campanha petista. Logo
depois, o Estadão publicou matéria em que Serra recuou de sua posição inicial,
mas sem admitir claramente que se equivocou, como é típico do tucano. Serra admitiu que o paciente "provavelmente tem catarata também". O Estadão
publicou ainda matéria dizendo que José Machado exige desculpas de Serra.
Todo
o imbróglio foi retomado no programa de Haddad, trazendo agora as denúncias de
que Serra contradisse José Machado e quebrou o sigilo do paciente. Serra sentiu-se
ofendido e pediu direito de resposta. A justiça de São Paulo deu razão ao tucano. Para o juiz Marco Antônio Vargas, a campanha de Haddad valeu-se de insinuações
ao sugerir que Serra “tratou como mentiroso” o paciente José Machado. Ora, se o
cidadão diz que tem uma doença e o Serra vai à Imprensa dizer que o cidadão não
tem isso, não, que a doença é outra, o cidadão passa pelo que? Homem de
palavra? Tanto o paciente foi desmoralizado pelo candidato do PSDB, que ele, com
muita pertinência, exigiu um pedido de desculpas. Mas, para o juiz de São
Paulo, a vítima foi o Serra, que ganhou um direito de resposta de 2 minutos e 26 segundos (tempo
completamente atípico!), pra dar uma explicação totalmente inócua da diferença entre pterígio
e catarata, e aproveitar para atacar mais ainda o PT.
Eleitoralmente,
Serra saiu por cima, ganhando mais espaço na televisão – e retirando do
principal adversário, num momento decisivo da campanha. Serra deveria fazer um
pedido de desculpas formal, como foi exigido por José Machado, mas isso teria
que ocorrer dentro do tempo de TV do próprio tucano, e na Imprensa, para a qual
Serra fez declarações erradas e tomou o paciente por mentiroso. O candidato do
PSDB utilizou os expedientes mais baixos, e ainda foi indevidamente
beneficiado. Por sua vez, o maior prejudicado em toda história foi o cidadão,
que teve sua privacidade violada, seu nome exposto de forma pejorativa e sua
palavra posta em xeque. A ele, não foi concedido o devido direito de resposta.
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