quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Decisões da Justiça Eleitoral que preocupam II – Serra desmoraliza cidadão e Justiça pune PT


Esse foi provavelmente o caso de direito de resposta mais revoltante da campanha de 2012. A história começou quando o Haddad mostrou em seu programa de TV, sobre saúde, o caso de José Machado, um idoso, morador da periferia de São Paulo, que espera há dois anos por uma cirurgia de catarata. Até aí, nada de mais. É bem comum os programas eleitorais usarem depoimentos de cidadãos na TV. A questão foi que José Serra reagiu a esse caso, dizendo que tudo era uma invenção do PT, e que o cidadão sequer tinha catarata. A doença de José Machado seria, segundo Serra, o pterígio - crescimento de tecido sobre a córnea. Para fazer todas essas declarações, é claro, Serra precisou ter acesso ao prontuário do paciente, o que deveria ser sigiloso, mas esse sigilo foi quebrado pela prefeitura, para repassar dados ao candidato que representa a gestão – o primeiro absurdo.

Toda a versão de Serra sobre o caso pode ser observada nessa entrevista que ele concedeu à TV Estadão. O candidato do PSDB sustenta que quem quebrou sigilo foi o PT, ao levar o caso à televisão, e é veemente ao afirmar que o paciente não tem catarata. Serra é tão categórico ao falar sobre o assunto que tenta constranger os jornalistas perguntando: “Vocês concordam que não era catarata? Sim ou não? [...] Não era catarata. Eles já admitiram que não era catarata [...] Eles mentiram, eles fizeram uma farsa”. 
  

Bem, o Estadão não deixou por isso mesmo e foi atrás do exame a que José Machado tinha se submetido. O jornal constatou que o paciente tinha, SIM, catarata. Os exames tinham sido feitos há poucas semanas, e o laudo foi assinado em 4 de setembro pelo médico Pedro José Cardoso, do Instituto Cema. José Machado autorizou, por escrito, a divulgação dos dados pela campanha petista. Logo depois, o Estadão publicou matéria em que Serra recuou de sua posição inicial, mas sem admitir claramente que se equivocou, como é típico do tucano. Serra admitiu que o paciente "provavelmente tem catarata também". O Estadão publicou ainda matéria dizendo que José Machado exige desculpas de Serra.

Todo o imbróglio foi retomado no programa de Haddad, trazendo agora as denúncias de que Serra contradisse José Machado e quebrou o sigilo do paciente. Serra sentiu-se ofendido e pediu direito de resposta. A justiça de São Paulo deu razão ao tucano. Para o juiz Marco Antônio Vargas, a campanha de Haddad valeu-se de insinuações ao sugerir que Serra “tratou como mentiroso” o paciente José Machado. Ora, se o cidadão diz que tem uma doença e o Serra vai à Imprensa dizer que o cidadão não tem isso, não, que a doença é outra, o cidadão passa pelo que? Homem de palavra? Tanto o paciente foi desmoralizado pelo candidato do PSDB, que ele, com muita pertinência, exigiu um pedido de desculpas. Mas, para o juiz de São Paulo, a vítima foi o Serra, que ganhou um direito de resposta de 2 minutos e 26 segundos (tempo completamente atípico!), pra dar uma explicação totalmente inócua da diferença entre pterígio e catarata, e aproveitar para atacar mais ainda o PT.

Eleitoralmente, Serra saiu por cima, ganhando mais espaço na televisão – e retirando do principal adversário, num momento decisivo da campanha. Serra deveria fazer um pedido de desculpas formal, como foi exigido por José Machado, mas isso teria que ocorrer dentro do tempo de TV do próprio tucano, e na Imprensa, para a qual Serra fez declarações erradas e tomou o paciente por mentiroso. O candidato do PSDB utilizou os expedientes mais baixos, e ainda foi indevidamente beneficiado. Por sua vez, o maior prejudicado em toda história foi o cidadão, que teve sua privacidade violada, seu nome exposto de forma pejorativa e sua palavra posta em xeque. A ele, não foi concedido o devido direito de resposta. 

sábado, 22 de setembro de 2012

Decisões da Justiça Eleitoral que preocupam – Aécio pinta e borda e Justiça pune PT


Muitas decisões da Justiça Eleitoral têm se mostrado preocupantes nas eleições desse ano. Uma que chamou atenção aconteceu em Belo Horizonte, pelo mérito da decisão e pelo que não foi considerado em todo o processo. O que aconteceu foi que Aécio Neves mexeu seus pauzinhos pra deixar tudo conforme seus interesses, e no final a Justiça ainda aplicou uma punição à chapa do PT. Aécio não tinha um nome de peso para a sucessão de Minas em 2014. Seu pupilo, atual governador, Antônio Anastasia, não pode mais concorrer. O prefeito de BH, Márcio Lacerda, do PSB, seria um nome bastante competitivo. Mas o presidenciável tucano tinha um obstáculo: o vice, na chapa de Lacerda à reeleição, era um petista. E deixar um petista na prefeitura da capital não podia fazer partes dos planos de Aécio. O prefeito, do PSB, concorreria à reeleição em 2012, com o apoio de tucanos e de petistas. Fazia parte do acordo para ter o apoio do PT, a posição de vice e a coligação proporcional para os vereadores. E isso estava acertado em documento assinado, segundo o presidente nacional do PT. 

No último dia para as coligações, Márcio Lacerda mandou avisar ao PT que mudara de ideia, que não queria mais a chapa proporcional para a câmara. E não tinha volta. Foi o estopim para a frágil aliança. Em questão de horas, o PT decidiu pela candidatura própria. Patrus Ananias foi declarado candidato. Um ponto especialmente intrigante foi que, após o rompimento com o PT, imediatamente Lacerda conseguiu atrair para sua chapa dois partidos que já estavam com candidatos definidos e oficializados, o PTB e o PV. O candidato verde, aliás, era um conhecido crítico da gestão municipal. Dizem que Aécio participou destas costuras políticas. Já os petistas conseguiram o apoio do PMDB, do PC do B, do PRB, do PDT e do PSD, este último por intermédio de Dilma Rousseff. O PSD, porém, ficou dividido. Enquanto a direção nacional optou por Patrus, dirigentes locais gostariam de continuar com Lacerda e o PSDB. A Justiça de Minas garantiu a legenda na chapa de Lacerda.

O juiz relator do processo alegou que “a direção nacional do PSD não concorda com a coligação municipal formada com o PSB, porque esse partido desligou-se do PT. Todavia, no momento da convenção realizada dia 26/06/2012 não havia essa orientação”. O que é estranho, porque a convenção do PSD não teria como imaginar que um acordo seria rompido, especificando o que deveria ser feito, caso o prefeito voltasse atrás em uma posição. Algo assim seria absurdo. A decisão da Justiça também partiu do pressuposto de que Kassab teria interferido indevidamente no processo, e que os defensores da aliança com o prefeito representavam a ‘resistência’, os guardiões do verdadeiro sentimento do PSD de Minas. Essa foi a versão amplamente disseminada pelos meios de comunicação. Kassab era sempre enquadrado como o interventor, com motivações “políticas”. Como se as outras motivações fossem diferentes. A Justiça ainda aplicou multa de R$ 10 mil à chapa de Patrus, e retirou PRB e PDT da coligação. 


Se o apoio do PSD ao Patrus atenderia a interesses externos, nacionais, do PT; por sua vez, o apoio do PSD ao Lacerda também atendeu aos interesses do PSDB, e muito diretamente ao interesse de Aécio Neves, presidenciável tucano. Não há, nesse caso, movimentações que não sejam de natureza política. Diante disso, era de se esperar que a instância nacional de uma legenda tivesse ascendência sobre a instância local, é o mínimo que se entende sobre organização partidária. Mas o pior foi ter considerado as motivações de Kassab menos nobres do que as daqueles que defendiam a aliança com Lacerda – aliados diretos de Aécio. O presidente do diretório estadual do PT chegou a falar com todas as letas que “um acordo assinado foi rasgado. O Márcio [Lacerda] optou por atender aos caprichos do príncipe Aécio”. Todas as ações foram bem administradas, para que Aécio, agora, tenha um candidato ao governo de Minas, um vice-prefeito de BH do seu grupo, o PT alijado de todo o processo, tudo a partir de um problema na coligação dos vereadores que funcionou como cortina de fumaça. E nada disso mereceu uma linha nas análises midiáticas. Como se já não bastassem todos os relatos de que a Imprensa mineira arrasta um bonde pelo Aécio, agora temos essa decisão jurídica bastante esquisita.